Após o limiar da era da internet, o jornalismo participativo, também conhecido como cidadão ou colaborativo, ganha novas acepções e atribuições devido às possibilidades interativas presentes na chamada Web 2.0, mas, seus objetivos continuam os mesmos e cada vez mais fáceis de alcançarKarina Negreiros
Colaboradores do mundo, uni-vos! Embora, ninguém, de fato, pronuncie este brado retumbante pelas páginas da nova versão da teia mundial de computadores, a chamada Web 2.0, o fato é que as possibilidades interativas hoje presentes na internet têm agregado uma legião de militantes da participação virtual, quer seja na construção de notícias, quer apenas nos diálogos triviais do cotidiano.
No caso particular das notícias online, tem surgido um movimento que está surpreendendo até mesmo as grandes marcas do jornalismo tradicional, como a CNN, a BBC e as nacionais Globo e Folha, por exemplo. Tais empresas jornalísticas estão abrindo cada vez mais espaço para a participação do leitor, desde a elaboração de pautas, passando pela confecção e edição da notícia, até a construção de comentários sobre o produto noticioso, muitas vezes com conhecimento de causa suficiente para discordar e corrigir as informações ali publicadas.Tais mudanças no jornalismo tradicional surgiram a partir do movimento do jornalismo colaborativo, que nasceu de iniciativas como a da wikipedia, onde o conteúdo é escrito a várias mãos, por qualquer um, em qualquer lugar e o blog, onde se pode ter acesso às opiniões do blogueiro, que em alguns casos é um jornalista, além de comentar o que é ali divulgado. A partir disso, não demorou muito para surgirem manifestações populares envolvendo a produção e divulgação de notícias. Blogueiros de todo mundo começaram a postar assuntos referentes ao que estava acontecendo no universo de cada um. Acontece que, além dos cotidianos, fatos de relevância internacional começaram a ser “cobertos” por pessoas comuns, que se destacavam por dois motivos: 1) estavam diretamente envolvidos com o fato, ou por morarem próximos ao acontecimento, ou por estarem vivenciando as conseqüências daquele fato, como na guerra do Iraque, por exemplo, onde os blogs da região davam notícias mais precisas e interessantes que os jornais da grande mídia; 2) por possuírem acesso à internet e, conseqüentemente, às ferramentas necessárias para publicar e comentar notícias sobre aquele fato.Dessa forma, os blogs noticiosos começaram a fazer um sucesso mundial estrondoso. Em paralelo, outras formas de produzir notícias colaborativas foram surgindo. Os sites de jornalismo colaborativo, como o coreano OhMy News! e o americano Slashdot são expoentes de tal modo de produção. Há também os brasileiros Overmundo, um site de jornalismo cultural colaborativo, o CMI, Centro de Mídia Independente e o Wikinotícias, que não é apenas brasileiro, mas uma versão em língua portuguesa do Wikinews, onde se constroem notícias em ferramenta wiki. Tais manifestações são conhecidas pelo nome de “jornalismo participativo” porque envolvem a participação total ou parcial do cidadão comum no processo da produção de notícias. É também por esse motivo que esse tipo de produção é conhecida por outros nomes como jornalismo cidadão, jornalismo colaborativo, entre outros. Mas o jornalismo participativo propriamente dito não foi sempre entendido dessa forma.O sociólogo Herbert J. Gans, em seu livro Democracy and the News (2003), define o jornalismo participativo como aquele em que o jornalista deve produzir notícias que encorajem a participação pública e política do cidadão, ou seja, que construam cidadania. Para Gans, a notícia participativa “deve presumir que os cidadãos são tão relevantes e importantes quanto as pessoas públicas”. O sociólogo define o termo mais em função do que é produzido e menos em função do produtor. O jornalismo em si continuaria a ser feito pelo próprio jornalista. Este profissional é quem deve se preocupar em garimpar notícias da vida política informal do cidadão, mobilizando-o a atuar na vida pública, noticiando histórias bem-sucedidas de participação cidadã e indicando em suas reportagens as diversas estratégias das quais ele dispõe para sanar os problemas públicos e políticos que o afligem. É o repórter servindo de mediador, dando voz ao cidadão comum, mas não é ainda o cidadão comum construindo a notícia com sua própria voz. Já Michael Schudson, professor de comunicação e sociologia da Universidade da Califórnia, em artigo publicado no Media Studies Journal, em 1995, diz que há uma diferença entre o cidadão “informacional” e o informado. O primeiro tem a informação à sua disposição, mas é saturado por ela, não sendo necessariamente um cidadão informado. Nas palavras de Schudson: “até mesmo um público com informação na cabeça não é necessariamente um público com a motivação ou a capacidade para agir em uma democracia”. O cidadão informado, segundo o professor, “é aquele que não possui apenas a informação, mas um ponto de vista e preferências com as quais ele as interpreta”. Assim, Schudson sugere formas de atuação da imprensa para ajudar a formar o que ele chama de “público informado”, cumprindo, desse modo, um serviço à democracia. Essas formas , em geral, se assemelham às idéias de Gans (o professor inclusive cita o sociólogo no artigo). Em uma de suas propostas para uma mídia mais democrática, Schudson, por exemplo, defende uma postura contrária a um preceito clássico do jornalismo, o da objetividade. Ele sugere que “para ajudar o cidadão comum a entender o complexo universo da política, o jornalista deve analisá-la e interpretá-la de modo que este cidadão possa entender e poder agir”.Os dois teóricos prenunciam o fenômeno que vemos hoje na versão moderna do jornalismo participativo. Mas, o que talvez eles não tenham previsto é que tecnologias simples como as que estão por trás dos blogs e das ferramentas wiki funcionando no complexo e radical mundo da internet pudessem elevar a participação cidadã na elaboração da agenda de notícias a patamares tão altos. O cidadão digital participa mais ativamente da vida pública e política através desse novo modo de fazer notícia que aquele que apenas lia o jornal, ouvia o rádio e assistia à TV. Participando, escrevendo, fotografando e filmando fatos noticiosos ele interage com a notícia, mostrando seu ponto de vista acerca desses fatos, interpretando-os, portanto. É o cidadão informado que Schudson descreve. O passivo passou a ser agente. Mas, a pergunta que fica é: onde está o papel do jornalista nesse novo cenário em que uma notícia pode ser produzida, editada, divulgada, comentada e corrigida por qualquer um, a qualquer hora e em qualquer lugar?
Após o limiar da era da internet, o jornalismo participativo, também conhecido como cidadão ou colaborativo, ganha novas acepções e atribuições devido às possibilidades interativas presentes na chamada Web 2.0, mas, seus objetivos continuam os mesmos e cada vez mais fáceis de alcançarKarina Negreiros
Colaboradores do mundo, uni-vos! Embora, ninguém, de fato, pronuncie este brado retumbante pelas páginas da nova versão da teia mundial de computadores, a chamada Web 2.0, o fato é que as possibilidades interativas hoje presentes na internet têm agregado uma legião de militantes da participação virtual, quer seja na construção de notícias, quer apenas nos diálogos triviais do cotidiano.
No caso particular das notícias online, tem surgido um movimento que está surpreendendo até mesmo as grandes marcas do jornalismo tradicional, como a CNN, a BBC e as nacionais Globo e Folha, por exemplo. Tais empresas jornalísticas estão abrindo cada vez mais espaço para a participação do leitor, desde a elaboração de pautas, passando pela confecção e edição da notícia, até a construção de comentários sobre o produto noticioso, muitas vezes com conhecimento de causa suficiente para discordar e corrigir as informações ali publicadas.Tais mudanças no jornalismo tradicional surgiram a partir do movimento do jornalismo colaborativo, que nasceu de iniciativas como a da wikipedia, onde o conteúdo é escrito a várias mãos, por qualquer um, em qualquer lugar e o blog, onde se pode ter acesso às opiniões do blogueiro, que em alguns casos é um jornalista, além de comentar o que é ali divulgado. A partir disso, não demorou muito para surgirem manifestações populares envolvendo a produção e divulgação de notícias. Blogueiros de todo mundo começaram a postar assuntos referentes ao que estava acontecendo no universo de cada um. Acontece que, além dos cotidianos, fatos de relevância internacional começaram a ser “cobertos” por pessoas comuns, que se destacavam por dois motivos: 1) estavam diretamente envolvidos com o fato, ou por morarem próximos ao acontecimento, ou por estarem vivenciando as conseqüências daquele fato, como na guerra do Iraque, por exemplo, onde os blogs da região davam notícias mais precisas e interessantes que os jornais da grande mídia; 2) por possuírem acesso à internet e, conseqüentemente, às ferramentas necessárias para publicar e comentar notícias sobre aquele fato.Dessa forma, os blogs noticiosos começaram a fazer um sucesso mundial estrondoso. Em paralelo, outras formas de produzir notícias colaborativas foram surgindo. Os sites de jornalismo colaborativo, como o coreano OhMy News! e o americano Slashdot são expoentes de tal modo de produção. Há também os brasileiros Overmundo, um site de jornalismo cultural colaborativo, o CMI, Centro de Mídia Independente e o Wikinotícias, que não é apenas brasileiro, mas uma versão em língua portuguesa do Wikinews, onde se constroem notícias em ferramenta wiki. Tais manifestações são conhecidas pelo nome de “jornalismo participativo” porque envolvem a participação total ou parcial do cidadão comum no processo da produção de notícias. É também por esse motivo que esse tipo de produção é conhecida por outros nomes como jornalismo cidadão, jornalismo colaborativo, entre outros. Mas o jornalismo participativo propriamente dito não foi sempre entendido dessa forma.O sociólogo Herbert J. Gans, em seu livro Democracy and the News (2003), define o jornalismo participativo como aquele em que o jornalista deve produzir notícias que encorajem a participação pública e política do cidadão, ou seja, que construam cidadania. Para Gans, a notícia participativa “deve presumir que os cidadãos são tão relevantes e importantes quanto as pessoas públicas”. O sociólogo define o termo mais em função do que é produzido e menos em função do produtor. O jornalismo em si continuaria a ser feito pelo próprio jornalista. Este profissional é quem deve se preocupar em garimpar notícias da vida política informal do cidadão, mobilizando-o a atuar na vida pública, noticiando histórias bem-sucedidas de participação cidadã e indicando em suas reportagens as diversas estratégias das quais ele dispõe para sanar os problemas públicos e políticos que o afligem. É o repórter servindo de mediador, dando voz ao cidadão comum, mas não é ainda o cidadão comum construindo a notícia com sua própria voz. Já Michael Schudson, professor de comunicação e sociologia da Universidade da Califórnia, em artigo publicado no Media Studies Journal, em 1995, diz que há uma diferença entre o cidadão “informacional” e o informado. O primeiro tem a informação à sua disposição, mas é saturado por ela, não sendo necessariamente um cidadão informado. Nas palavras de Schudson: “até mesmo um público com informação na cabeça não é necessariamente um público com a motivação ou a capacidade para agir em uma democracia”. O cidadão informado, segundo o professor, “é aquele que não possui apenas a informação, mas um ponto de vista e preferências com as quais ele as interpreta”. Assim, Schudson sugere formas de atuação da imprensa para ajudar a formar o que ele chama de “público informado”, cumprindo, desse modo, um serviço à democracia. Essas formas , em geral, se assemelham às idéias de Gans (o professor inclusive cita o sociólogo no artigo). Em uma de suas propostas para uma mídia mais democrática, Schudson, por exemplo, defende uma postura contrária a um preceito clássico do jornalismo, o da objetividade. Ele sugere que “para ajudar o cidadão comum a entender o complexo universo da política, o jornalista deve analisá-la e interpretá-la de modo que este cidadão possa entender e poder agir”.Os dois teóricos prenunciam o fenômeno que vemos hoje na versão moderna do jornalismo participativo. Mas, o que talvez eles não tenham previsto é que tecnologias simples como as que estão por trás dos blogs e das ferramentas wiki funcionando no complexo e radical mundo da internet pudessem elevar a participação cidadã na elaboração da agenda de notícias a patamares tão altos. O cidadão digital participa mais ativamente da vida pública e política através desse novo modo de fazer notícia que aquele que apenas lia o jornal, ouvia o rádio e assistia à TV. Participando, escrevendo, fotografando e filmando fatos noticiosos ele interage com a notícia, mostrando seu ponto de vista acerca desses fatos, interpretando-os, portanto. É o cidadão informado que Schudson descreve. O passivo passou a ser agente. Mas, a pergunta que fica é: onde está o papel do jornalista nesse novo cenário em que uma notícia pode ser produzida, editada, divulgada, comentada e corrigida por qualquer um, a qualquer hora e em qualquer lugar?
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